Áreas de atuação do Birô no Brasil
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Ciência e Educação



O Birô dividia com outras agências do governo estadunidense as responsabilidades nessa importante área de atuação. Na hierarquia das prioridades de Tio Sam, ciência e educação não eram consideradas essenciais em matéria de defesa, mas recaíam na rubrica de “atividades que podem influenciar de modo imediato no aumento da simpatia da América Latina para com os Estados Unidos”; e recaíam também nas preocupações de “influência a longo prazo na promoção da compreensão hemisférica” – para usar as frases do próprio Birô.

As principais formas de atuação consistiam em assistência (material e técnica), assim como intercâmbio.
O padrão geral da política de assistência fundava-se na convicção das carências latino-americanas e na perfeição de modelos institucionais estadunidenses, que seriam padrões ideais a serem implantados no restante das Américas. Através de escolas agronômicas existentes ou então criadas e por intermédio de programas de treinamento mais ágeis, procurava-se iniciar os latino-americanos nos mistérios do solo, das sementes e do uso de implementos agrícolas (incidentalmente fabricados nos Estados Unidos). Do mesmo modo, éramos também notavelmente carentes de técnicas de administração, comércio, serviço social, medicina etc. e o modo estadunidense de administrar, gerir, trocar, assistir, curar etc. começou a impregnar o sistema educacional do restante do continente.

O Brasil estava plenamente inserido nesse processo e foi objeto de extensa atuação nesse setor. Nessa época, fortaleceram-se também as escolas estadunidenses, assim como ampliou a atuação dos institutos culturais estadunidenses em território brasileiro. Embora tivesse aparecido pouco antes da guerra, o IBEU (Instituto Brasil-Estados Unidos) ganhou um formidável impulso nesse momento, constituindo não apenas um centro difusor da língua inglesa, mas também um centro de atividades culturais variadas (palestras, concertos etc.) de importância crescente. O governo estadunidense deu incentivos também à difusão do ensino do inglês, por meio de livros, filmes, discos e exposições itinerantes. Os funcionários do Birô no Brasil notavam com satisfação, em 1943, que as escolas estadunidenses precisavam ser urgentemente ampliadas, devido à demanda crescente de matrículas por parte das famílias brasileiras de classe média. Começaria a partir daí o declínio do francês como língua por excelência das chamadas elites culturais do país.

No plano do intercâmbio, a atividade do Birô e outras agências públicas e privadas dos Estados Unidos foi avassaladora. Embora o intercâmbio sugerisse troca de experiência e de especialistas em bases igualitárias, o movimento assumiu duas características preocupantes: primeiro, o número de estadunidenses que vieram ao Brasil durante a guerra era infinitamente superior aos brasileiros que iam aos Estados Unidos. Em 1942, já estávamos inundados de jornalistas, escritores, músicos, diplomatas, empresários, técnicos, estudantes, pesquisadores de mercado oriundos do norte – o que levou o ministro Osvaldo Aranha à tirada bem-humorada de que “mais uma missão de boa vontade e declaramos guerra aos Estados Unidos!” A própria Embaixada Estadunidense preocupava-se com número de seus compatriotas ensinando, indagando, investigando e também gastando de uma maneira pouco comum entre os brasileiros.

É claro que havia exceções louváveis entre os que vieram ao Brasil e não usavam os óculos do preconceito e do utilitarismo empresarial ou político. Cientistas sociais como Herskowitz e Wagley produziram nessa época textos relevantes sobre o Brasil, discrepando freqüentemente da visão primária e utilitária que afluía dos escritos oficiais do governo estadunidense.

As exceções, exatamente por serem exceções, permitem-nos perceber como era capenga o intercâmbio proposto pelo Birô Interamericano. Os especialistas estadunidenses vinham à América Latina ensinar suas técnicas e exibir suas realizações, enquanto os brasileiros e os latino-americanos em geral eram levados aos Estados Unidos para “ter uma impressão favorável dos Estados Unidos e retornarem aos seus países com sentimentos de amizade, de boa vontade para com os Estados Unidos”. 
Em poucas palavras, os brasileiros iam aos Estados Unidos para aprender; os estadunidenses vinham ao Brasil para ensinar.

O objetivo político dos programas do Birô: produzir o alinhamento brasileiro não à causa liberal-democrática ou aos Estados liberais em geral, mas aos Estados Unidos. Fazer a guerra no front político e “psicológico” era exatamente isso: ganhar os corações e mentes dos vizinhos do sul, para o projeto hegemônico de Tio Sam.
 


 
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Tio Sam chega ao Brasil: a penetração cultural americana / Gerson Moura. - 1. ed. - São Paulo: Brasiliense, 1984. - (Coleção tudo é história; 91)
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