Sudeste: Cozinha Mineira
Alimentação de um Inconfidente 
em vila Rica:
Vicente Vieira da Mota, contador-chefe dos contratos de João Roiz de Macedo, só foi preso por ordem da Alçada em 10 de maio de 1791, à noite.
Foi conduzido para a Cadeia Pública de Vila Rica, tendo sido assistido por ordem de Macedo nos três dias que lá permaneceu antes de ser transferido para o Rio de Janeiro. O documento abaixo, além do interesse histórico pela personalidade do réu, dá uma idéia da alimentação mineira no fim do século XVIII:

Em 11 de maio de 1791 principiei a assistir ao Sr. Capitão Vicente Vieira da Mota por ordem do Sr. João Roiz:

Almoço de chocolate e torradas;
Jantar de vaca cozida e assada com molho e galinha ensopada.........
¼ - 4
Doce ........
       3
Ceia de frango com molho de azeite e vinagre, ervas e canjica....
¼ 
Dia 12
Almoço na forma do primeiro dia;
Jantar de vaca e galinha com molho de azeite e vinagre, e salada..
¼ - 4
Doce .........
       3
Ceia de ervas e frango assado, e o mais......
¼ 
Doce .........
      2
Dia 13
Almoço como no primeiro dia;
Jantar de peixe, ervas com ovos, aletria, bacalhau com ovos...
¼ - 4
Ceia de peixe na mesma forma...
¼ - 2
De doce .........
      4
De ovos e açúcar .......
¼ 
De azeite de mamona ...
      2

2 ½ - 4
A quantia é de 2 oitavas e meia e 4 vinténs de ouro, equivalente a cerca de 9 gramas de ouro, dando um preço para a alimentação da época bem mais elevado que o de hoje.
O dia 13 de maio de 1791 foi sexta-feira, dia de abstinência de carne. O peixe fresco, raridade em Vila Rica, não obstante não era mais caro que as demais refeições.
Arquivo Público Mineiro
seleção de Hélio Gravatá


A semântica do século XVIII era diversa, embora os hábitos fossem praticamente iguais. O almoço se chamava jantar, e o jantar se chamava ceia. O mesmo fenômeno ocorreu no francês, língua em que o dejeuner (desjejum) subiu para o sol do meio-dia, e o diner (almoço) passou a significar o nosso jantar ou janta atuais. Vê-se que o atraso do relógio não foi apenas mineiro ou brasileiro...
Assim, quando em Vila Rica, Cláudio Manuel da Costa reunia os seus amigos Tomás Antônio Gonzaga e Alvarenga Peixoto para um jantar inconfidente, precisamos entender que o fazia na hora máxima do sol e não às ave-marias, porque o almoço de então ainda tinha sentido árabe de mordidela, café da manhã, ou refeição leve da primeira hora diurna. E neste caso, não tomavam café – cujo reinado apenas nascia. O desjejum era provavelmente cometido ao chocolate, como vemos no documento nutricional de outro inconfidente, preso na Cadeia, Vicente Vieira da Mota, dois anos mais tarde.

Tarquínio Barbosa de Oliveira


Fogão de Lenha – 300 anos de cozinha mineira / Maria Stella Libânio Christo. – Petrópolis: Editora Vozes Ltda, 1978 – 2ª edição.
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