Terra Brasileira
O Garimpo
Do rendimento dos ribeiros e de diversas qualidades de ouro que deles se tira
Das Minas Gerais dos Cataguás as melhores e de maior rendimento foram, até agora, a do ribeiro do Ouro Preto, a do ribeirão de Nossa Senhora do Carmo e a do ribeiro de Bento Rodrigues, do qual, em pouco mais de cinco braças de terra, se tiraram cinco arrobas de ouro. Também no rio das Velhas é muito abundante de ouro, assim pelas margens como pelas ilhas que tem, e pela madre ou veio da água, e dele se tem tirado... quantidade abundante.

Mineradores - Rugendas - Biblioteca Municipal de São Paulo

Chamam os paulistas ribeiro de bom rendimento o que dá em cada bateada duas oitavas de ouro. Porém, assim como há também bateadas de três, quatro, cinco, oito, dez, quinze, vinte e trinta oitavas e mais, e isto não poucas vezes sucedeu na do ribeirão, na de Ouro Preto, na de Bento Rodrigues e na do rio das Velhas.

Os grãos de maior peso que se tiraram, foram um de noventa e cinco oitavas, outro de três libras, que repartiram entre si três pessoas com um machado, outro, que passou de cento e cinqüenta oitavas, em forma de uma língua de boi, que se mandou ao governador da Nova Colônia, e outro maior de seis libras.

Quanto às qualidades diversas do ouro, sabe-se que o ouro, a quem chamam preto, por ter na superfície uma cor semelhante à do aço, antes de ir ao fogo, provando-se com o dente logo aparece amarelo, vivo, gemado, e é o mais fino, porque chega quase a vinte e três quilates; e quando se lhe põe o cunho, na fundição, faz gretas na barreta, como se arrebentasse de todas as partes; e de dentro dá tais reflexos que parecem raios de sol. O do ribeirão é mais miúdo e mais polme, e compete na bondade com o ouro preto, porque chega a vinte e dous quilates. O ouro do ribeiro de Bento Rodrigues, posto que seja mais grosso e palpável, e bem amarelo, contudo não tem a perfeição do ouro preto e do ouro do ribeirão, mas, quando muito, chega a vinte quilates. O ouro do ribeiro do Campo, e o do ribeiro de Nossa Senhora de Monserrate, é grosso, e muito amarelo, e tem vinte e um quilates e meio. O ouro do rio das Velhas é finíssimo e chega a vinte e dous quilates. O ouro, finalmente, do ribeiro de Itatiaia, é de cor branca, como a prata, por não estar ainda bem formado, como dissemos acima, e deste se faz pouco caso, posto que alguns digam que, indo ao fogo às vezes por mais formado, foi mostrando a cor amarela.

Houve ano em que, de todas estas minas ou ribeiros, se tiraram mais de cem arrobas de ouro, fora o que se tirava e tira escondidamente de outros ribeiros que os descobridores não manifestaram, para os não sujeitarem logo à repartição. E, se os quintos de El-Rei chegaram a dezassete e a vinte arrobas, sonegando-se tanto ouro não quintado, bem se deixa ver que o ouro que cada ano se tira, sem encarecimento algum, passa de cem arrobas, e que nestes dez anos passados se tem tirado mais de mil arrobas, nos outros certamente passaram. E continuando ao presente o rendimento com igual ou com maior abundância por razão do maior número dos que se empregam em catar, só os quintos devidos a Sua Majestade se foram notavelmente diminuindo, ou por se divertir para outras partes o ouro em pó, ou por não ir à Casa dos Quintos, ou por usarem alguns de cunhos falsos, com engano mais detestável. Mas, ainda assim, não deixou Sua Majestade de ter grande lucro na Casa da Moeda do Rio de Janeiro, porque comprando o ouro a doze tostões a oitava, e batendo-se em dous anos três milhões de moeda nacional e provincial de ouro, foi lucrando seiscentos mil cruzados de avanço.

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Registro de André João Antonil (João Antônio Andreoni), Cultura e Opulência do Brasil, publicado pela primeira vez em 1711 em Lisboa.