Saber um pouco mais... (5)



 
 
 
 

Queimada em Roraima
Foto: Araquém Alcântara (1998)

O jornalista Marcelo Leite, editor de Ciência do jornal Folha de São Paulo e autor do livro Floresta Amazônica (Publifolha), não vê progresso algum do Brasil na questão ambiental, que continua descasada de um planejamento estratégico do governo. “Só depois de publicados em revistas internacionais artigos alertando para a possibilidade de indução de desmatamento como resultado das obras de infra-estrutura é que o governo promete aprofundar estudos de impacto ambiental. Sem pressão da opinião pública nacional e internacional, o governo faz muito pouco para prevenir problemas futuros e gasta enorme quantidade de recursos em atividades de fiscalização e repressão, necessárias, mas que não são solução”, observa o jornalista, para quem há muitos projetos isolados, mas falta um planejamento mais global para a região, uma política para a Amazônia que coordene de forma racional atividades menos agressivas, como manejo sustentável de madeira, sistemas agro-florestais e ecoturismo.

 
 
 
 
 

Queimada e desmatamento no entorno do
Parque Indígena do Xingu (MT)
Foto: Pedro Martinelli  (1999)

Entre os poucos projetos brasileiros, um dos considerados prioritários na opinião de Paulo Adário, do Greenpeace, é a demarcação das terras indígenas, preservando um patrimônio cultural e florestal, já que os índios vivem na floresta há centenas de anos e possuem grande conhecimento da natureza. Mas nem para assegurar demarcações eficazes, e livres de invasões, o governo atual tem mostrado capacidade. Segundo levantamento feito pela Funai, nada menos que 84% dos territórios indígenas já demarcados sofrem avarias de toda ordem – como problemas de arrendamento, exploração mineral e florestal, perturbações provocadas pela construção de estradas e interferência do setor elétrico.

 
 
 
 
 

Balsa de garimpeiros no rio Madeira (RO)
Foto: Araquém Alcântara (1996)

Para a senadora Marina Silva a ausência de um projeto que sistematize a parceria da pesquisa científica com as comunidades da floresta é um desperdício, uma vez que os índios têm conhecimento milenar da biodiversidade que cerca suas culturas, assim como o caboclo e o ribeirinho têm intimidade de séculos de convivência com as soluções que a floresta oferece. “Qualquer abordagem sobre a Amazônia que não considere essas contribuições preexistentes na região padece de distanciamento da realidade. E às vezes a ciência, de forma prepotente, nega a riqueza desse conhecimento”, sentencia Marina.

 
 

Lagartas no Parque Nacional do Araguaia (TO)
Foto: Araquém Alcântara (1996)

O primeiro projeto de maior amplitude de acesso à biodiversidade brasileira, aliando desenvolvimento sustentável e conservacionismo ambiental, foi de autoria da própria senadora em seu primeiro mandato, 1995. Incluía, entre outros princípios, como acessar os recursos naturais e remunerar o saber, levando em conta o reconhecimento das populações. Segundo Marina, a sustentabilidade tem de se dar mediante uma “tríplice aliança” envolvendo Estado, o dono dos recursos (proprietário) e o investidor. “Se o Estado autoriza o investimento, mas a comunidade não concorda, nada feito. Tem haver sintonia”.

 
 
 

Menino da comunidade de pescadores
no município de Soure, Ilha de Marajó (PA)
Foto: Araquém Alcântara (1997)

O projeto da senadora regulamentava o acordo da biodiversidade convencionado na Eco 92 e ratificado pelo Brasil em 1994 – porém, sem nenhuma outra iniciativa governamental. O Legislativo aprovou, mas o governo segurou. “Para tapar o buraco, e por uma necessidade circunstancial de legitimar um contrato envolvendo os interesses de uma multinacional, o governo apresentou medida provisória que nada mais foi que uma compilação malfeita do projeto original. Uma espécie de biopirataria institucional. Agora, que empresa séria fará investimentos eloqüentes e duradouros num assunto regulado por medida provisória?”, questiona. Com a total negligência federal, Marina classifica os governos do Acre, de Jorge Viana, e do Amapá, de João Alberto Capiberibe, como dois raros pólos que estão levando a sério o desenvolvimento sustentável.

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Paulo Donizetti / Amazônia o alvo da maior cobiça do mundo (colaboração Glauco Faria) in Revista Fórum n.º 1, agosto de 2001, São Paulo: Editora Publisher Brasil.
Fotos de Araquém Alcântara e Pedro Martinelli / Biodiversidade na Amazônia Brasileira - São Paulo: Co-edição Instituto Socioambiental e Editora Estação Liberdade, 2001.